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Tuesday, February 14, 2006

Viagem Interior

Esta é a história do rabino Eisik, contada por Henrich Zimmer, e que eu encontrei num livro de Mircea Eliade. Vou transcrever:

"Esse piedoso rabino, Eisik de Cracóvia, teve um sonho que lhe mandava que fosse a Praga: aí, sob a grande ponte que leva ao castelo real, descobriria um tesouro escondido. O sonho repetiu-se três vezes, e o rabino decidiu-se a partir. Chegado a Praga, encontrou a ponte, mas guardada por sentinelas; Eisik não ousou investigar. Girando sempre pelos arredores, atraiu a atenção do capitão dos guardas; este perguntou-lhe amavelmente se perdera alguma coisa. Com ingenuidade, o rabino contou-lhe o seu sonho. O oficial explodiu em gargalhadas: «Realmente, homenzinho!», disse-lhe ele, «tu usaste os teus sapatos para percorrer todo este caminho simplesmente por causa de um sonho? Que pessoa, de posse da sua razão, acreditaria num sonho?» O próprio oficial ouvira uma voz em sonhos: «Falava-me de Cracóvia, ordenando-me que fosse lá e procurasse um grande tesouro na casa de um rabino cujo nome era Eisik, filho de Jekel. O tesouro devia ser descoberto num recanto poeirento, onde estava enterrado por detrás do fogão.» Mas o oficial não tinha qualquer fé nas vozes escutadas em sonhos: era uma pessoa de juízo. O rabino inclinou-se profundamente, agradeceu-lhe e apressou-se a regressar a Cracóvia. Cavou no canto abandonado da casa e descobriu o tesouro que pôs fim à sua miséria."

E agora os comentários de Heirich Zimmer: "Assim, o verdadeiro tesouro, o que põe fim à nossa miséria e às nossas provações, nunca está muito longe, não é preciso ir buscá-lo a um país longínquo, jaz enterrado nos recessos mais íntimos da nossa própria casa, isto é, do nosso próprio ser. Está atrás do fogão, o centro que fornece de vida e calor, que comanda a nossa existência, o coração do nosso coração, se soubermos cavar. Mas há então o facto estranho e constante de que é só após uma viagem piedosa a uma região longínqua, num país estrangeiro, sobre nova terra, que o significado dessa voz interior que guia a nossa procura poderá revelar-se-nos. E a esse facto estranho e constante junta-se outro: aquele que nos revela o sentido da nossa misteriosa viagem interior deve ser, ele mesmo, um estrangeiro, doutra crença ou de outra cultura."

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