Boa tarde.
Permitam-me que lhes fale um bocadinho do meu bosque. Fica a cerca de 200km da minha casa e, por isso, não vou lá muitas vezes. Mas, dedico todos os dias alguns minutos àquele lugar. Mesmo assim, não consigo protegê-lo. O ano passado cortaram um jovem abrunheiro e deixaram-no lá, caído no chão. Não sei por que o fizeram. Disseram-me que talvez tenha sido «apenas» para experimentar o gume de uma foice. O que causa ainda mais tristeza... Bem, creio que nunca fariam isso a uma oliveira ou qualquer outra fruteira. O corte dos sobreiros e das azinheiras é proibido por lei, mas nem isso é respeitado. E, na mente dos meus conterrâneos, que importância pode ter um abrunheiro, um espinheiro-alvar ou um sabugueiro? Cortam-nos se lhe apetecer, mesmo que estejam em terras que não lhes pertencem.
Os teixos praticamente desapareceram, em parte devido aos pastores, que os cortavam sempre que os viam. O veneno do teixo condenou-o...e, pelo menos no meu mundo, das teixeiras já só há memórias. Tenho alguns pés a crescer em vasos, mas ainda não me atrevi a colocá-los no meu bosque.
Depois, bem depois há ainda os caçadores, sobretudo os caçadores furtivos. Há javalis que frequentemente percorrem o meu bosque e todos os dias peço aos deuses que olhem por aqueles belos animais, para que os seus trilhos sejam seguros. Contudo, a ameaça dos caçadores furtivos mantém-se bem real. Sei que muitos deles apanham os javalis com armadilhas. Cortam uma árvore, um freixo ou um carvalho e prendem-no à armadilha. Quando o animal é apanhado, não morre logo, corre em desespero amarrado a uma árvore, causado imensa devastação e sofrendo uma morte lenta e dolorosa. Nem é só a questão de matarem um animal, o que é pior é que o matam de um modo vergonhoso. E eu arrepio-me só de pensar nisso.
E temo também por um belo freixo que já faz parte de mim e que, infelizmente, está numa posição que o candidata a ser uma dessas árvores abatidas e presas às armadilhas.
Oh! Como eu gostava que o mundo fosse diferente...
Bem, na semana passada, descobri que as minhas aveleiras tinham desaparecido. Sei bem que o responsável foi o meu vizinho que, provavelmente, pensou que me estava a fazer um favor. Eram pequenos pés, plantados no último outono. Jovens rebentos imersos num mar de erva alta, que havia de ser tirada, com cuidado. Mas, antes que eu tivesse oportunidade de tirar a erva, o meu vizinho limpou essa parte do terreno com uma roçadora e lá se foram as aveleiras. Confesso que nunca pensei que as aveleiras corressem perigo...
Na verdade, no último Lughnasadh, que foi quando comecei a dedicar-me a este bosque/jardim, tinha uma visão de tudo isto bem mais romântica... Era um terreno que eu conhecia, mas onde já não ia há muito tempo. Quando lá voltei, deparei logo na entrada com um maravilhoso urzal, que me deixou num estado de espírito fantástico. Sentei-me num rochedo a observar uma águia. De repente, tive consciência da coincidência e senti-me transportada para a canção de Amergin, foi um momento de revelação. Fiquei com a convicção de que seria um caminho muito fácil de percorrer, mas isso não é verdade. É um caminho árduo, que me causa tristeza, mas também imensa alegria. Vou tendo fracassos - as minhas bétulas não nasceram -, mas também há sucessos - deparei com uma macieira silvestre, que eu nem sabia que lá estava, com uma floração magnífica, que me deixou com o coração em festa.
Contudo, não me sinto mais perto das respostas. Na verdade, nem sei ainda quais as questões que devo colocar. Mas, isso é a meta. E, de alguma forma, a meta deixou de importar. Podia dizer que é o calcorrear do caminho que é importante, mas eu nem sei bem se isto é um caminho, no sentido espiritual, quero eu dizer. É quanto muito um sonho. Um sonho que eu gosto de sonhar, só me custa saber que não sou capaz de proteger aquele pequeno bosque.