O Sol, fonte de vida, está na origem de muitas das crenças do homem primitivo. Nas antigas civilizações, o homem via os solstícios como aberturas opostas do céu, como portas por onde o Sol entrava e saía, ao terminar o seu curso, em cada círculo tropical. No panteão romano, esse conceito foi personificado pelo deus Janus. O seu nome deriva de janua, palavra latina que significa porta. Janus era representado com duas faces simetricamente opostas, pois era aquele que olhava para o passado e em simultâneo para o futuro. Na concepção do homem primitivo, que representava o tempo de um modo cíclico, Janus presidia ao Solstício de Inverno e ao seu oposto na roda do ano, o Solstício de Verão. Representava as duas portas solsticiais, as portas do céu. Como guardião das portas do céu, era por vezes representado com um molho de chaves na mão – alegoria que passa para S. Pedro, já sem relação com os solstícios e, por essa razão, desprovida da sua verdadeira essência.
Tradicionalmente, tanto para o mundo oriental quanto para o ocidental, o solstício de Câncer (Caranguejo), ou da Esperança, Verão no Hemisfério Norte, é a porta cruzada pelas almas mortais e, por isso, chamada de Porta dos Homens, enquanto que o solstício de Capricórnio, ou do Reconhecimento, Inverno no Hemisfério Norte, é a porta cruzada pelas almas imortais e, por isso, denominada Porta dos Deuses.
No simbolismo cristão, as festas dos solstícios são, em última análise, as festas de São João Batista e de São João Evangelista. São dois São João e há, aí, uma evidente relação com o deus romano Janus e suas duas faces. Tendo sido a semelhança entre as palavras Janus e Joannes o que facilitou a troca do Janus pagão pelo João cristão. Continua, aí, a dualidade transmitida por Janus, como princípio da vida: diante de Câncer (Caranguejo), Capricórnio; diante dos dias mais longos, do verão, os dias mais curtos, do inverno; diante de São João (do inverno), com as trevas, Capricórnio e a Porta de Deus, o São João (do verão), com a luz, Câncer e a Porta dos Homens.
E se com o tempo se perdeu, em parte, a festa solsticial de São João Evangelista, já o mesmo não aconteceu com a festa do nascimento de Cristo. Sabemos bem que Cristo não nasceu realmente no Natal. Contudo, que melhor alegoria do que colocar o nascimento de Cristo na festa solsticial da Porta dos Deuses, tendo diante de si a Porta dos Homens? Senão, vejamos a simbologia associada à configuração da constelação de Caranguejo: na tradição hebraica, as duas estrelas principais da constelação de Caranguejo são chamadas de Haiot Ha-Kadosh, ou seja, animais de santidade, designados pelas duas primeiras letras do alfabeto hebraico, Aleph e Beth, correspondentes ao burro e ao boi. Estas duas estrelas chamam-se em latim Asellus, diminutivo de Asinus, referindo-se portanto a burricos. Diante delas, há um pequeno conglomerado de estrelas, denominado, em latim, Praesepe, que significaria estrebaria, curral, manjedoura, ou presépio.
Esse simbolismo dá sentido ao nascimento de Jesus a 25 de dezembro, sob o signo de Capricórnio, durante o Solstício de Inverno, sendo colocado numa manjedoura, entre um burro e uma vaca, apontando dessa forma, simbolicamente, para a constelação de Caranguejo e para o Solstício de Verão. Tal como Janus, Jesus aponta as duas portas solsticiais: da Porta dos Deuses, aponta para a Porta dos Homens.
Este post é baseado no texto São João e a Tradição Maçônica, de Wagner Veneziani Costa e Celso Ferrarini.
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